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Mudou o paradigma no setor elétrico

Artigo publicado em 28/02/2023 por Valor.

O setor elétrico brasileiro tem sim com o que se preocupar. Não há ainda ou não se tem conhecimento de um plano para operar a rede diante de uma oferta dominada por fontes renováveis – variáveis e descentralizadas. E não se tem a menor ideia de como alocar eventuais riscos e custos da geração distribuída, que demandará mais do sistema para manter a confiabilidade.

Mas, sem quaisquer explicações, a não ser a resolução de interesses particulares, perde-se precioso tempo com a discussão do preço mínimo, se deve ou não contemplar os custos de Itaipu. Tal pendenga foi arbitrada pelo judiciário, numa anomalia que virou padrão.

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O grande salto para trás

Artigo publicado em 19/01/2021 por Valor Econômico.

Paul Ormerod, em O Efeito Borboleta, descreve uma inspiradora experiência que Brian Arthur e dois matemáticos russos traduziram em elegantes equações. Já falei dela aqui no Valor. De uma urna, que contém uma quantidade não conhecida de bolas, é retirada uma da cor azul, que é reposta, só que ao lado de outra da mesma cor. Embora os efeitos sejam ínfimos, isto eleva as chances de a próxima bola retirada ser também azul, independentemente da proporção original entre azuis e brancas. Este efeito é um feedback positivo. Não é o que vemos no Brasil do século XXI.

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Vacina, nudge e economia

Artigo publicado em 17/12/2020 por Valor Econômico.

A cadela ganhou o nome de Vacina. Era um tributo ao cientista Oswaldo Cruz, que livrou muita gente da febre-amarela e da varíola, inclusive Dona Júlia. Quando saía de casa, Júlia deixava Vacina por lá, a cuidar dos seus três netos. Postada no batente, Vacina não deixava ninguém entrar. Nem sair. Atenta, latia a cada movimento estranho. Nas folgas, espantava raposas, camaleões e até o Carcará.

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AINDA A REVISÃO TARIFÁRIA EXTRAORDINÁRIA DAS DISTRIBUIDORAS – QUAL O PARÂMETRO? QUAL O FUNDAMENTO?

Gustavo Kaercher Loureiro e Edvaldo Santana

Introdução

Este artigo é a terceira parte de um estudo acerca de aspectos jurídicos e econômicos da RTE das distribuidoras no contexto do que (muito amplamente) se convencionou chamar de “Pandemia do Covid 19[1]”. Na Parte I foram estabelecidas as premissas do estudo e foi realizada uma panorâmica do grande conjunto de problemas e questões que o tema suscita. Na Parte II nos ocupamos de importantes aspectos procedimentais da RTE, suscitados pelo Parecer 262/2020. Veremos agora nesta Parte III elementos materiais da RTE, também trazidos pelo referido Parecer.

Em diversas passagens da manifestação jurídica da ANEEL topamos com a ideia de que, se vingar, a RTE deverá garantir ao concessionário apenas o quanto necessário para que possa seguir prestando adequadamente o serviço público. Ali vem dito que “[a ] tutela da equação econômica do contrato visa proteger a continuidade da concessão e não o retorno esperado do concessionário”[2]; que cabe à ANEEL “avaliar, no contexto de cada mercado, se a concessão sofreu impactos significativos, substanciais e extraordinários que possam comprometer a manutenção e a continuidade da prestação do serviço adequado[3]”, dentre outras.

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O Apagão e as cabeças.

O que há de novo no Apagão do Amapá? Nada. Nem o jogo de empurra. Como em 2009, não foi um raio. Pelo que disse o ONS em carta, o Apagão era previsível e evitável. Ou não? Não pense que esses eventos vêm só dos equipamentos. Eles decorrem da irracional governança da rede. Mesmo sendo um monopólio natural, existem 300 concessionários de transmissão. Monopólio de 300? E conduzido por um Conselho de Administração de 20 membros. Sempre cabe mais um. Como coordenar isso? Várias SEs têm 4 concessionários. Estupidez.

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Desequilíbrio estável – parte 2

Não faz muito tempo fui convidado para falar 60 minutos sobre cotas. Deram-me 30 dias para organizar o que dizer. Não precisava tanto. As cotas fazem parte das minhas preocupações profissionais e acadêmicas desde 2012, quando o governo Dilma criou as de energia elétrica.

Chegou o dia da palestra. Apresentei-me 15 minutos antes. A sala estava com 80% de ocupação, algo como 150 pessoas, em geral jovens e negras. Isto era inédito no setor elétrico, em que eu, e talvez mais um ou dois, éramos os únicos negros em um universo desse tamanho. Tentei iludir-me com a ideia de que estariam ali para prestigiar um brother. Mas não era nada disso. Na hora que o coordenador do evento fez a abertura de praxe, percebi que minha fala seria sobre cotas raciais, assunto que entendo tanto quanto a geologia. Nada seria muito.

Um choque. Sem saída, e para ganhar tempo enquanto vasculhava alguma coisa na memória, perguntei se alguém poderia explicar as características do número 365. Silêncio. E do número 28? O silêncio ficou agressivo. As pessoas me olhavam com se vissem ali um E.T. Como não tinha outra maneira, comecei a falar sobre o primeiro vestibular de que tive conhecimento, em 1970, que contemplava provas orais, isto é, arguições perante uma banca de professores, todos brancos. Falei também do meu pai, que nascera em 1899, ainda em uma senzala, apesar da Lei Áurea. E fui por aí.

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REFLEXÕES JURÍDICAS E ECONÔMICAS ACERCA DA RTE DAS CONCESSIONÁRIAS DISTRIBUIDORAS DE ENERGIA ELÉTRICA – PARTE II

Gustavo Kaercher Loureiro e Edvaldo Santana

Introdução

Na Parte I dessa série de quatro breves textos sobre a RTE das distribuidoras de energia apresentamos o conteúdo do que viria nos textos seguintes, assentamos as premissas de nossa análise e fizemos uma panorâmica de alguns temas que emergiram da AP 35. Prometemos para essa Parte II o exame de aspectos formais ou procedimentais (“como deve caminhar a RTE”), na suposição de que um bom procedimento é também algo de extrema importância para garantir, senão a correção no mérito, ao menos a legitimidade da ação do Regulador.

Não pretendemos discorrer genericamente sobre o que seria um “bom” andamento da RTE. Já faz algum tempo que a ideia de uma ação administrativa (devidamente) procedimentalizada se firmou em nosso ordenamento (por exigência constitucional positivada na Lei 9.784/1999[1]) e hoje ninguém mais duvida de que é necessário que a decisão dos poderes públicos – de caráter individual ou geral – seja fruto de uma série encadeada de atos, previamente estabelecidos e constitutivos de um itinerário que assegure valores como a previsibilidade, a transparência, a participação dos interessados, a fundamentação etc. Por melhor que seja no mérito, o simples “canetaço” de improviso não vinga mais (ou não deveria vingar). Discute-se, isso sim, sobre como efetivamente adequar o procedimento ao seu objeto específico e sobre quais são os mecanismos que podem garantir, em concreto, os valores acima indicados.

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REFLEXÕES JURÍDICAS E ECONÔMICAS ACERCA DA RTE DAS CONCESSIONÁRIAS DISTRIBUIDORAS DE ENERGIA ELÉTRICA – PARTE I

Gustavo Kaercher Loureiro e Edvaldo Santana

Introdução

Vai aumentar a conta de luz? Essa é, ao final das contas, a pergunta, um tanto simplória, que importa.

No balcão do quotidiano, respostas categóricas que vão do absoluto “sim!” ao peremptório “não!” podem se arrimar em escoras precárias como simpatias, paixões ou pura preferência de parte (consumidor, concessionário, poder político etc.).

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O desequilíbrio estável

Artigo publicado em 23/10/2020 por Valor Econômico.

Nas economias dos países de maior renda per capita da Organização para a Cooperação para o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a resistência a diferentes abalos pode ser comparada ao João Bobo, boneco de festas infantis. Balançam, podem encostar a cabeça no solo, mas voltam à condição original, ou próxima disto. Agora, com as crises sanitária e econômica mundiais, a Alemanha, Dinamarca, Suécia, Canadá e Nova Zelândia já estão a retornar para suas trajetórias econômicas de normalidade, apesar dos riscos de nova onda da Covid-19. Como o João Bobo, essas nações possuem um equilíbrio estável, de bases sólidas. A mesma coisa acontece com seus segmentos de infraestrutura, como o setor elétrico, de transporte e gás natural.

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A retirar uma bala, depois a outra e a outra

Artigo publicado em 02/09/2020 por Valor Econômico.

Quando criança, não entendia como e nem porque Deus teria criado ou permitido a criação de uma imensidão de famílias tão pobres, enquanto outras, uma minoria, eram tão ricas. O Padre Hélio Tourinho, então diretor do Educandário Dom Bosco, em Aracaju, tinha sempre uma resposta que parecia convencer o menino de 8 anos. Mas era um paradoxo.  

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A “curva do ganso” e as lições da crise da Califórnia

Edvaldo Santana

 

O último artigo (Crise na Califórnia? E no Brasil?) foi concluído com uma pergunta, se crise semelhante poderia acontecer no Brasil, particularmente no Nordeste, e uma resposta: NÃO. Mas que não deveríamos facilitar.

O setor elétrico brasileiro teve e ainda mantém uma forte inserção de fontes renováveis (15,5 GW de eólica, 15 GW de biomassa, 5,6 GW de PCH e 6 GW de solar, compreendendo, centralizada e geração distribuída – GD), que correspondem a cerca de 25% do total da capacidade instalada de geração. Na Califórnia, os 24 GW de fontes renováveis (60% de solar) equivalem a mais de 40% da capacidade instalada total, sem considerar a importação. Continuar lendo “A “curva do ganso” e as lições da crise da Califórnia”

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Crise na Califórnia? E no Brasil?

Edvaldo Santana

Comecei a trabalhar na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em julho de 2000. Em outubro do mesmo ano fui procurado por Maurício Correia, brilhante jornalista então na Gazeta Mercantil. Ele queria saber se a crise do setor elétrico brasileiro ganharia o mesmo caminho da crise californiana, com apagões e preços elevados. Falei que teríamos enormes dificuldades para atendimento da carga, mas os dois sistemas elétricos eram muito diferentes, inclusive quanto ao design.

Passados 20 anos, o perfil da oferta de energia mudou muito, lá e aqui, mas o sistema elétrico da Califórnia entrou em nova crise, semelhante à que aconteceu no mesmo período em 2018 e 2019. No site do CAISO, operador do sistema elétrico de lá, são encontrados avisos de interrupção e agradecimentos pela colaboração dos consumidores. Ele também implora o uso racional da energia. A desativação de uma planta nuclear e de algumas termelétricas é a “pinguela” entre a crise de 2000 e as dificuldades atuais.

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Custos de transação e o efeito “passar a boiada”

Artigo publicado em 19/08/2020 por Valor Econômico

Fico apreensivo sempre que preciso usar um táxi em cidades que não conheço. A apreensão aumenta em cidades específicas, como Rio de Janeiro, São Paulo, New York e Lisboa. E sei que estou prestes a ser enganado quando o condutor indaga: qual trajeto o senhor costuma fazer? Posso seguir um trajeto com mais corredores de ônibus? No caso geral, tais perguntas fazem parte de uma tática para descobrir se o passageiro conhece ou não a cidade. O trajeto será o mais caro para quem não a conhece, que também jamais saberá se o caminho “selecionado” tem ou não a maior proporção dos tais corredores de ônibus.

Depois de um tempo, entendi que era sempre melhor contratar um táxi daqueles com preço fixo, mesmo que fossem mais caros. Esse custo adicional, que pagava para evitar ser objeto de uma trapaça, é um custo de transação, também chamado de custo do oportunismo. Os investidores estrangeiros, quando analisam potenciais empreendimentos no Brasil, sabem muito bem de onde surgem os custos de transação e que eles importam.

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O alvo móvel do regulador do regulador

Edvaldo Santana

As críticas ao cálculo das tarifas não vêm de agora. A grande maioria é injusta com a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) ou desconhece os conceitos tarifários. Uma dessas críticas, sustentada por partidos então no governo, referendada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), “deu liga” e prosperou. Resultou, em 2008, na Comissão Parlamentar de Inquérito das Tarifas, a CPI das Tarifas.

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As pequenas distribuidoras mostram a razão de a livre escolha ser o melhor caminho: a diferença entre Ativos e Passivos

Edvaldo Santana

Tenho acompanhado as reuniões públicas da Diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). É uma mania. Faço isso desde que deixei a Agência. Em uma dessas reuniões, que entre vários assuntos homologou o reajuste das tarifas de uma pequena distribuidora, foi estimulante o comentário de um dos diretores quanto à possibilidade de redução dos custos da compra de energia por meio do mercado livre. É uma opção prevista em lei para as concessionárias e as permissionárias com carga menor que 700 GWh/ano.

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A doença dos custos no setor elétrico e a pirâmide de benefícios


Edvaldo Santana

O último artigo (A assimetria do design e a desarmonia dos custos) foi concluído com uma rápida referência à doença dos custos, também conhecida como o “efeito Baumol”. Alguns leitores, de agências reguladoras, empresas e do meio acadêmico, solicitaram um detalhamento do conceito e, como é o padrão do Papo de Energia, com uma aplicação. Pedido aceito. No que consiste a doença dos custos? Como ela atua no setor elétrico?

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A assimetria do design e o custo da desarmonia

Edvaldo Santana

Este artigo faz parte de uma série de textos em que são analisadas as falhas no atual design do setor elétrico brasileiro. No centro das discussões estão os problemas associados à má alocação de riscos e custos. Disso já decorre um teorema, adiante enunciado, aqui chamado de “teorema dos custos da desarmonia”, uma homenagem aos efeitos assimétricos do referido design e às consequências disso sobre os custos.

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Subsídio: o nome do jogo

Bem antes da pandemia, eram utilizados 40% da geração instalada. É uma ociosidade muito cara. Desvirtua a alocação de custos. Os números assustam. Segundo a Aneel, há 174 GW de potência instalada. O consumo médio é de 58 GW, mas usei 65 GW para 2020. Se é razoável um Fator de Carga de 0,6, a geração instalada seria de 108 GW. Prudente, apliquei 120 GW, dado o perfil das fontes. Há, então, um excedente de 54 GW, ao custo de R$ 5.000/kW (média EPE). Utilizamos a tx. de desconto de 8% a.a., em 25 anos, prazo médio do CCEAR. Com tais dados, a ociosidade custaria R$ 44/MWh, SEM O&M. Este é o valor pago a MAIS pela energia comprada, que a Aneel calculou em R$ 230/MWh. Continuar lendo “Subsídio: o nome do jogo”

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Jogo jogado!

Voltei a conversar com um velho amigo. Formado em 1960, já fez de tudo no setor elétrico. De operador de usinas a diretor de grandes empresas. Estudioso, fez alguns comentários sobre o quadro atual. Da Conta Covid, sua análise é desconcertante. Se os CCEARs têm prazo médio de 25 anos (300 meses), como 3 meses de receitas 10% reduzidas afetam a saúde do setor? Fiquei sem jeito. Continuar lendo “Jogo jogado!”

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Energia muito cara, tarifa mais ainda: mandingas e bruxarias – Parte 2

Edvaldo Santana 

 

No artigo anterior, Parte 1, de 16/06/2020, chamei de mandinga tarifária à habilidade para transformar custos diretos em encargos. E chamei a atenção para os custos de geração. Para facilitar a compreensão, estruturei uma tarifa hipotética, proporcional aos custos de compra de energia definidos nos processos de reajustes autorizados até a 1ª semana de junho deste ano. A propósito, se esperasse a reunião da Diretoria da ANEEL do dia 17/06, o custo médio de compra de energia teria passado de R$ 220/MWh para R$ 230/MWh. Continuar lendo “Energia muito cara, tarifa mais ainda: mandingas e bruxarias – Parte 2”

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Energia muito cara, tarifa mais ainda: mandingas e bruxarias – Parte 1

Edvaldo Santana

 

Antes da pandemia, em uma viagem a serviço, o passageiro ao meu lado, me vendo analisar um texto sobre o setor elétrico, perguntou-me porque as tarifas eram tão elevadas, se a energia comprada nos leilões custava tão pouco.

Mostrou-me, no celular, notícia com o valor da energia comprada em leilões de eólica e solar – menos de R$ 100/MWh. Ele também tinha dificuldade de entender porque pagava quase seis vezes mais para sua distribuidora. Dei-lhe uma resposta padrão. Aquela energia representava pouco em relação ao total consumido e demoraria a ser utilizada. Ainda bem que ele não insistiu. Saiu desconfiado. E tinha razão. Continuar lendo “Energia muito cara, tarifa mais ainda: mandingas e bruxarias – Parte 1”

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O martelo da Conta-Covid

Edvaldo Santana 

 

Como bem nos lembrou recentemente Ricardo Lima, um brilhante técnico do setor elétrico, “para quem só tem um martelo, todo problema parece um prego“. Esta frase, de Mark Twain, diz muito sobre as soluções contemporâneas do setor elétrico brasileiro, em que tudo se resolve com um empréstimo, nosso martelinho de ouro. Os consumidores, que pagam a conta, seriam os pregos. Continuar lendo “O martelo da Conta-Covid”

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Precisamos respirar, estúpidos

Artigo publicado em 09/06/2020 por Valor Econômico.

 

Migrei para o Rio de Janeiro no início dos anos 1970. Era uma época conhecida como do milagre econômico. Adequada para quem precisava estudar e trabalhar. Não era assim para o negro. Os anúncios de empregos vinham com o aviso de “exige-se boa aparência”. Aquelas três palavras gritavam que os negros não seriam bem-vindos. Era uma sentença, uma pré-seleção de cunho racista. A aparência, no caso, a cor, era um atributo eliminatório.

Superado esse primeiro obstáculo, a luta seguia contra a desconfiança. Nas entrevistas, as perguntas para os negros eram intimidatórias. Para mim, por exemplo, um selecionador quis saber quantas bolas de tênis eram necessárias para preencher uma piscina olímpica. Com desprezo, disse-me que eu teria quanto tempo quisesse para responder, e levantou-se. Tinha mais o que fazer.

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Contribuição à Consulta Pública 35/2020 – Regulamentação da Conta-Covid

Autor da Contribuição: Edvaldo Alves de Santana

 

  1. Considerações iniciais 

A ANEEL, como sempre, tem agido com transparência e qualidade técnica no tratamento de tema tão importante como a especificação de uma norma para levar a efeitos o que estabelecem a MP 950/2020 (MP) e o Decreto 10.350/2020 (Decreto). A Nota Técnica 077/2020 (NT), de diversas áreas, e o Voto da Relatora são exemplos disso.

Tenho algumas discordâncias. No geral, entendo que tanto o Decreto quanto a norma submetida à Consulta Pública ampliam muito o escopo da necessária MP. É essencial a atuação do governo no caso específico, mas ela não poderia resultar em custos excessivos para os consumidores. A decisão precisa contemplar uma solução equilibrada, que está nas mão da Aneel e dos agentes. Ambos sempre fizeram isso muito bem. Apresento a seguir, sob a forma de contribuições, minhas principais divergências. Continuar lendo “Contribuição à Consulta Pública 35/2020 – Regulamentação da Conta-Covid”

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Porque fracassamos

Artigo publicado em 26/05/2020 por Valor Econômico.


Edvaldo Santana

O paradoxo do brasileiro foi impecavelmente apresentado pelo filósofo e economista Eduardo Giannetti (“Vícios privados, benefícios públicos?”) como uma impossibilidade lógica. “Aos seus próprios olhos, cada indivíduo é bom, progressista e até gostaria de poder dar um jeito no país”. Mas isso “não bate com a realidade do todo melancólico e exasperador chamado Brasil”. O todo não corresponde às partes.

Em seu artigo de 10 de maio no Estadão o ex-ministro da Fazenda, Pedro Malan, com a preocupação de quem foi essencial para retirar o Brasil de uma de suas maiores enrascadas, esse “dar um jeito”, ou

a superação da atual crise de saúde, econômica e social, dependerá de engenho, arte e serenidade, atributos raríssimos há um bom tempo.

E eu diria que está na escassez desses três predicados a explicação para a conclusão de Giannetti, da impossibilidade lógica. Continuar lendo “Porque fracassamos”

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Conta Covid e os Mercados Livre e Regulado

Edvaldo Santana

Se alguém ainda tinha dúvida quanto às vantagens do mercado livre (ACL) em relação ao mercado regulado (ACR), não tem mais. Basta ler a ilustrativa matéria do excelente Luciano Costa (da Reuters) em 20/05. A propósito, por que não há uma Conta Covid para o ACL?

Os efeitos da pandemia para as comercializadoras serão da ordem de R$ 5 bilhões, algo como a metade do valor estimado da Conta Covid. Tal Conta consiste no meio que foi proposto em uma Medida Provisória para repassar dinheiro dos consumidores para o caixa dos geradores, transmissores e distribuidores, que também foram fortemente alcançados pela crise. Continuar lendo “Conta Covid e os Mercados Livre e Regulado”

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Conta Covid: declaração de renúncia, dividendos e remuneração

Edvaldo Santana 

Não tenho dúvida de que a pandemia, que resultou no decreto de calamidade pública, merece uma atenção especial por parte do regulador e/ou do poder concedente. E isto cabe para todos os segmentos de infraestrutura. Devem ser também reconhecidas algumas características do setor elétrico, que é organizado sob a forma de rede e com ativos específicos. Nestas circunstâncias,  a predominância de custos afundados e a possibilidade de contaminação de diversos elos da cadeia torna a situação ainda mais sensível e complexa. O que questiono, com insistência, é o desequilíbrio da solução que se discute, denominada de Conta Covid, para a qual o consumidor não é um desses elos.
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O setor elétrico e seus paradoxos

Edvaldo Santana

 

Em 1993, no livro “Vícios privados, benefícios públicos?”, o Professor Eduardo Giannetti descreveu o paradoxo dos brasileiros.  Independentemente do qual lado estamos, “cada um de nós, isoladamente, tem um sentimento e a crença sincera de estar muito acima de tudo isso que aí está”. Só que “a autoimagem de cada uma das partes não bate com a realidade do todo melancólico e exasperador chamado Brasil”. Há, então, uma impossibilidade lógica. O todo não corresponde às partes. (Relembrando: é um livro editado em 1993.)

O setor elétrico também sofre desse tipo de paradoxo. Em uma dessas excelentes, oportunas e instrutivas “lives” que vêm sendo realizadas diariamente, uma palestrante, isolada e corajosamente, defendia uma solução equilibrada para a crise deixada pela Covid-19. Entendia que a conta não deveria ser repassada apenas para os consumidores. Na prática, a crise só pegou o setor em cheio porque muita coisa teria deixado de ser feita no passado recente. Continuar lendo “O setor elétrico e seus paradoxos”

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Farinha pouca, meu pirão (ou subsídio) primeiro: o caso do Grupo A

Edvaldo Santana

 

É uma pena, mas não são pequenas as chances de o setor elétrico sair da pandemia com pelo menos mais um subsídio. Das 180 emendas à Medida Provisória 950/2020, grande parte trata da criação ou ampliação de subsídios. A consequência é que o setor ficará ainda mais caro e distante da racionalidade econômica. Continuar lendo “Farinha pouca, meu pirão (ou subsídio) primeiro: o caso do Grupo A”

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O péssimo e velho normal do setor elétrico

Edvaldo Santana

Artigo publicado em 30/04/2020 por Valor Econômico.

Antigos professores de matemática básica costumavam utilizar o primeiro dia de aula para verificar o background dos seus alunos. Fui submetido a um desses testes com um problema bem elementar, aqui levemente modificado: uma camisa de goleiro e uma bola de futebol custam, juntas, R$ 250. O preço da camisa é R$ 100 maior que o da bola. Quanto custa a bola?

Em agosto de 2017, aqui no Valor, publiquei artigo (Dinheiro saindo pelo vertedouro), no qual afirmava que, somados os esqueletos recentes, os consumidores assumem passivos de mais de R$ 250 bilhões. E o destaque era que se não existisse a intervenção do governo a conta para o consumidor não alcançaria os R$ 4 bilhões. Não parece, mas há relação entre o problema da bola de futebol e os bilionários esqueletos do setor elétrico. Continuar lendo “O péssimo e velho normal do setor elétrico”

O declínio da Light

Artigo publicado em 23/02/2023 por Globo.

É obscuro o futuro da Light, distribuidora de eletricidade do Rio de Janeiro. E respingará nos consumidores, no mínimo com mais aumento de tarifas. A perda não técnica (PNT), eufemismo para furto de energia, é a razão, mas não única, para o desequilíbrio financeiro da companhia que em 2025 fará 120 anos.

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